Corações, vão-se lá perceber... (recuperado)

Os foguetes lançam-se ao céu, para uma morte certa e cruel. Oiço os seus estalinhos antes de se levantarem do solo firme, como que se estivessem a pedir ajuda para não os deixar partir numa viagem curta, mas dolorosa.

Os pássaros chegados na Primavera, infiltram-se em pequenas aberturas, feitas nas cascas mais suaves e macias das árvores que encontram, para fugir ao chorar da morte dos foguetes.

As nuvens, com um aspecto light , passam por cima de mim e vêem a morte daqueles condenados inocentes que foram atirados às mãos da inquisição que não perdoa. As brancas e quase transparentes nuvens ao verem-me, olham-me nos olhos tristes e enxaguados para ir, voando, ter com elas e fazer uma viagem rumo ao infinito. Já o fiz, melhor, a minha mente está neste momento algures no mundo, a divertir-se como se não houvesse amanhã.

Bem perto de mim, está o coração, que depois de me deixar por uns dias, regressou e implorou-me para regressar ao seu lugar. Estava com frio e precisava de alguém quente. Eu, que já sentia falta do meu fiel amigo, dei-lhe de novo a casa que reinava, e que reinará, espero eu, por muitos e muitos anos.

Ao ouvido, antes de entrar para um sombrio e medonho espírito afectado por sentimentos fortes e despedaçados, sussurrou-me e exclamou:

Passeei por ruas e avenidas da memória,

e um amor resgatei,

quero que vás ter com ele,

senão nunca mais o verei.

Fiquei perplexo, ele que me abandonará durante dias porque, imaginara eu, que algo de grave tivesse acontecido, na verdade foi assaltar a mente, enquanto esta viaja, para encontrar um amor perdido.

Onde já se viu, um coração andar pelas ruas das memórias sem dizer nada ao seu mentor?

Vão-se lá perceber os corações...

Rui Fernandes